Teatro Providência no Largo das Mercês - Joseph Léon Righini.

Teatro Providência no Largo das Mercês - Joseph Léon Righini.
Teatro Providência no Largo das Mercês - Litografia de Joseph Léon Righini. Fonte: Centro de Memória da UFPA

segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

Nas encruzilhadas da memória: encanto Maria...

Corpo Maria Molambo

Fotografia de Marivaldo Pascoal.

Dia da apresentação: 05/11/2019

Local: Teatro Universitário Cláudio Barradas. Belém/PA.

Performers-atuantes: Denis Bezerra, Edilene Rosa, Tarsila França.


O Ato Performativo “Nas Encruzilhadas da Memória: encanto Maria...” foi um trabalho artístico produzido a partir do convite da coordenação do XI Seminário de Pesquisa em Teatro da Escola de Teatro e Dança da UFPA, realizado em novembro de 2019, ao Grupo de Pesquisa Perau – Memória, História e Artes Cênicas na Amazônia/CNPq.

Este ato performativo faz parte do projeto de pesquisa Memória, História e Artes Cênicas na Amazônia/PROPESP/PPGARTES, que abre espaço para investigações que tenham como foco principal as artes da cena, em diálogo com a memória e a história, como campo teórico-metodológico. Assim, aspectos da cultura amazônica, da tradição e/ou da contemporaneidade, são elementos que nos interessam, seja no aspecto de uma escrita historiográfica, seja como experimentação e criação da linguagem cênica, partindo dos postulados sobre memórias, histórias, culturas.

“Nas Encruzilhadas da Memória: encanto Maria...” é um trabalho artístico que partiu do que chamamos de performatividades da cultura, ligado à linha de pesquisa “Memória e Performatividades” do grupo Perau, que desenvolve trabalhos artísticos no diálogo entre os Estudos da Memória e da História com os das Artes Cênicas, em especial os Estudos da Performance. O processo consistiu em trabalhar a memória cultural de uma entidade da Umbanda amazônica/brasileira: Maria Molambo.

Maria Molambo foi o mote para pensar alguns temas que me chamam atenção há um tempo, ligadas às práticas religiosas, com relação aos “despachos” (como são chamadas as oferendas deixadas nas encruzilhadas, cruzeiros, estradas, praias, etc.) que, frequentemente, vemos nas encruzilhadas das ruas de Belém e região metropolitana. Essa foi a primeira questão que me chamou atenção e, a partir disso, Maria Molambo foi escolhida ou fomos escolhidos por ela, para tal trabalho artístico.

Com o intuito de explorar a história da entidade, tanto a narrativa mítica-histórica, quanto a mítica-religiosa, mergulhei no processo de pesquisa documental (oral, visual, escrita) sobre Molambo, buscando na minha própria memória individual, a experiência de vida com ela, seja no terreiro em que me congrego, seja nos terreiros por onde andamos e visitamos. Vi algumas Marias Molambos e cada uma tem sua personalidade, sua performance, sua força. Porém, mesmo com performatividades diversas, Ela traz traços que unem as vária Marias, que chamamos de estruturas da narrativa, ou seja, os elementos comuns entre as variantes: os pontos cantados, a personalidade austera, séria, a gargalhada forte, marcante, aquela que não tem meia-palavra, diz o que precisa ser dito, sem arrodeio.

Com relação à narrativa mítica-histórica, as fontes escritas (encontradas em sua maioria em blog e redes sociais) contam que ora Molambo fora uma moça rica, nascida na nobreza europeia medieval, ora como uma moça pobre, que casara por interesses financeiros e não por amor. Contudo, depois de casada conhece o amor, mas fora dos laços matrimoniais. Independente das versões, a história de Maria Molambo sempre carrega a dor, o sofrimento, a morte, as violências de uma sociedade patriarcal, machista. Isso nos chamou atenção e buscamos dialogar com experiências de mulheres que passam ou passaram pelas mesmas situações.

Com isso, comecei a escutar algumas mulheres, eu contava um pouco da história de Molambo que ativava nelas suas histórias pessoais, familiares, em que a violência contra o ser mulher estão presentes. São as histórias de nossas mães, avós, bisavós, irmãs, cunhadas, amigas, vizinhas, desconhecidas que têm como marca a história de vida.

Assim, o conjunto de memórias, de oralidades, ganharam os corpos dos performes-atuantes, nos diálogos artísticos estabelecidos.

Corpo Maria Molambo - Tarsila França 
Fotografia de Marivaldo Pascoal


Corpo Maria Molambo - Edilene Rosa
Fotografia de Marivaldo Pascoal


Corpo Maria Molambo - Denis Bezerra
Fotografia de Marivaldo Pascoal


Corpo Malandro - Edilene Rosa
Fotografia de Marivaldo Pascoal


Corpo Zé - Denis Bezerra
Fotografia de Marivaldo Pascoal


Corpos Malandros e Molambos
Fotografia de Marivaldo Pascoal


Malandragem
Fotografia de Marivaldo Pascoal


Zé e Molambos
Fotografia de Marivaldo Pascoal


Olha o lixo, olha lixo, olha a lata, olha a lata
Fotografia de Marivaldo Pascoal


Molambos em baile
Fotografia de Marivaldo Pascoal












Performance Louvação Mariana

Gênero: performance.

Data: 15/11/2019

Loca: Cachoeira do Arari, Marajó/PA.

Artistas - Performers: Denis Bezerra e Rosilene Cordeiro

Fotografias apresentadas no texto: Rosilene Cordeiro, Cristina Carvalho, Denis Bezerra.

A performance Louvação Mariana foi um trabalho artístico realizado por Denis Bezerra e Rosilene Cordeiro, no dia 15 de novembro de 2019, no município de Cachoeira do Arari, arquipélago do Marajó/PA, durante a programação do evento V Seminário Brasileiro de Poéticas Orais, promovido pelo GT de Literatura Oral da Anpoll, a nível nacional; e pelo Núcleo de Pesquisa Culturas e Memórias Amazônicas - CUMA da Universidade do Estado do Pará, a nível local.

Essa performance surgiu a partir da motivação de realizar uma intervenção artística no evento. Inicialmente, os performers não sabiam em qual cidade, em específico, realizariam a ação, porque o evento teve programação em três municípios (Soure, Salvaterra e Cachoeira do Arari). A preparação se deu na ideia de fazer; sabíamos que em algum momento faríamos um ato público e que teríamos como mote a entidade da umbanda amazônica, cabocla Dona Mariana.

A escolha desse mote se deu porque, em paralelo, os dois performers participavam da exposição Nós de Aruanda – Artistas de Terreiro, com a obra Corpo encarnado na esquadra Mariana, uma instalação composta por objetos ligados à entidade dona Mariana e por fotografias produzidas a partir da experiência religiosa e de imersão no universo cultural amazônico, através de viagens por rios e cidades do estado do Pará, na transversalidade cultural com essa entidade. Ou seja, fotografias feitas em visitas em terreiros, ou de paisagens e situações em que os artistas se sentiam motivados ou presenciados pela cabocla, ou como se fala na linguagem de terreiro, sombreados, mareados pela presença da Arara Cantadeira.


Marinhar...

Partindo desse contexto, prestes a viajar para o evento no Marajó, e inspirados em dialogar com a cultura local a partir da prática religiosa que os atravessa, Rosilene e Denis decidiram produzir uma performance em que a cabocla Mariana seria o mote. Colocaram em uma mala roupas, tecidos, perfumes, chapéu, joias, elementos que compõem o corpo da entidade quando se apresenta em rituais.

No evento, deixaram-se agir pela “intuição”, para saber onde e em que momento o ato performativo seria realizado. Escolheram, então, o dia 15 de novembro, dia nacional da umbanda, que, “coincidentemente”, esse dia do evento seria realizado na cidade de Cachoeira do Arari, com uma programação sobre o escritor Dalcídio Jurandir, e os participantes do evento teriam, também, a oportunidade de presenciar a retirada, da floresta, da árvore que se tornaria os Mastros de São Sebastião, padroeiro da cidade, nos festejos do Santo em 2020.

Dessa maneira, a performance se iniciou desde do momento em que os dois artistas se arrumaram no hotel, já inspirados pela energia daquele dia, sem imaginar o que eles encontrariam no percurso entre as cidades de Soure a Cachoeira do Arari. No trajeto entre rios, estradas, campos marajoaras, a paisagem tão presente no imaginário literário (por exemplo no romance Chove nos Campos de Cachoeira, de Dalcídio Jurandir, em que ele narra e apresenta a realidade marajoara), eles foram dialogando com as pessoas que encontravam.

Imagem 1 – Campos secos, na margem da rodovia PA 154, que liga por terra à cidade de Cachoeira do Arari, Marajó/PA.

Foto: Denis Bezerra (2019)

Esse primeiro momento foi de surpresa porque não tínhamos ideia de como seria esse ritual de retirada dos mastros de São Sebastião. Então ficamos, todos, esperando o evento e deixamo-nos conduzir pela energia que se aproximava e, aos poucos, chegava: entre músicas, bebidas, comidas (farofa com fritas do vaqueiro), muito conhaque leite de onça (uma mistura de cachaça com leite), e os corpos ali festejando e celebrando com e para o Santo.

 

Imagem 2 – cortejo do mastro de São Sebastião da floresta para o munício. Momento em que os caminhões que transportavam os três troncos e os devotos do Santo chegam na rodovia.

Foto: Rosilene Cordeiro (2019).


Imagem 3 – Presenciando a chegada do cortejo

Foto: Rosilene Cordeiro (2019).

 Imagem 4 – Bandeira que simboliza o Santo.

Foto: Rosilene Cordeiro (2019).


Após esse momento, os participantes do evento seguiram os devotos do Santo em cortejo até o lugar onde seria deixado os três troncos de árvores retirados da floresta, em uma das fazendas marajoaras que ficam às margens da rodia PA 154. Esses troncos depois seriam transformados nos mastros (dos homens, das mulheres e das crianças) da festa de São Sebastião entre os meses dezembro de 2019 a janeiro de 2020, quando se encerra os festejos, precisamente no dia 20 de janeiro.

Seguimos pela rodovia, nos ônibus, vans até o momento em que os troncos seriam deixados em um lugar específico. Quando chegamos, os corpos, em êxtase celebraram juntos aquele momento. Nesse momento, Rosilene e Denis continuaram seus estados de performance, interagindo com todos, fazendo registros (fílmicos e fotográficos), entre música, comidas e bedidas.

A sequência fotográfica a seguir mostram a interação com a festa, com os promesseiros, com os brincantes da celebração, no momento de condução dos mastros até o local que ficariam até o dia de suas elevações, no mês de dezembro. As imagens foram feitas por Rosilene Cordeiro (2019).









O segundo momento do Ato performativo foi realizado no centro da cidade de Cachoeira do Arari, em torno da Câmara Municipal e do Museu do Marajó.

O momento dividiu-se em: a) construção do corpo Mariana, utilizando os elementos da visualizade da entidade Cabocla Marian; b) interação com os transeuntes, em sua maioria participantes do evento; trocas, conversas, beberagens com os interlocutores; c) consultas, cantos, passes, cortejos. A sequência fotográfica abaixo foram feitas por Cristina Carvalho.