Teatro Providência no Largo das Mercês - Joseph Léon Righini.

Teatro Providência no Largo das Mercês - Joseph Léon Righini.
Teatro Providência no Largo das Mercês - Litografia de Joseph Léon Righini. Fonte: Centro de Memória da UFPA

quinta-feira, 15 de maio de 2014

52 anos da Escola de Teatro e Dança da UFPA.

Compartilho o texto que foi publicado na coluna de Elias Pinto, no Caderno Você, do Jornal Diário do Pará, no último dia 11/05/2014.
http://digital.diariodopara.com.br/pc/edicao/11052014/voce






Denis Bezerra.[1]

No último dia 06 de maio, a Escola de Teatro e Dança da Universidade Federal do Pará completou 52 anos de fundação. Criado, em 1962, inicialmente como um curso livre de teatro, o antigo Serviço de Teatro da Universidade do Pará surgiu com o propósito de mudanças sociais, por meio das artes teatrais. No entanto, antes de relatar a importância e os primeiros movimentos dessa instituição, é necessário destacar os esforços feitos, pelo menos 20 anos antes, pelo estabelecimento de um espaço de formação teatral no estado do Pará.
Segundo o historiador Vicente Salles, (Épocas do Teatro no Grão-Pará ou Apresentação do Teatro de Época. TOMO II. Belém: UFPA, 1994), houve, nas décadas de 1940 e 1950, em Belém, um intenso movimento teatral de estudantes, com diversos grupos, compostos por universitários das Faculdades da cidade. Dentre esses grupos, destacam-se o Teatro do Estudante do Pará (1941-1951), liderado por Margarida Schivazappa e Francisco Paulo Mendes; e o Norte Teatro Escola do Pará (1957-1962), que tinha à frente Maria Sylvia e Benedito Nunes. Eles ligaram-se à política nacional, liderada por Paschoal Carlos Magno, de valoração do teatro de estudante e o fortalecimento do teatro amador no país.
O Teatro do Estudante do Pará foi um grupo buscou a renovação da cena local, tentando romper com uma tradição teatral, que consistia na produção de espetáculos comerciais, pautados na circulação de companhias nacionais e locais pelos palcos paraenses; além do chamado teatro popular. Interessados por mudanças, o TEP produziu trabalhos que pudessem levar ao público local peças, segundo os líderes, de “valor cultural”. Nisso, promoveram a circulação do denominado cânone, composto por obras “clássicas”, oriundas da dramaturgia europeia, fato que indica um elemento importante para uma leitura da produção cultural na cidade. Suas ações revelam a preocupação de um determinado grupo social de renovar a cena teatral local, oferecendo, segundo eles, o que de melhor existia da dramaturgia mundial. Tal ação pautou-se na busca de orientar, de apurar o olhar, ou seja, de promover uma educação estética da sociedade, não se preocupando com o que o público viesse a pensar, mas interessados em formar um determinado público.
Já o Norte Teatro Escola do Pará, fundado em 1957, surgiu inicialmente, segundo a diretora do grupo, Maria Sylvia Nunes, com a finalidade de ler e discutir poesia, apenas pelo simples prazer da recitação poética. Além disso, havia uma convivência de grupo, uma socialização de conhecimento entre os seus componentes, uma forma de construção intelectual coletiva, cada um compartilhava leituras e fazia com que circulasse, entre o grupo, essas experiências estéticas. Assim, o grupo teve seu primeiro grande trabalho, em 1958, quando participara do Primeiro Festival de Teatro de Estudante do Brasil, em Recife, a convite de Paschoal Carlos Magno, com a montagem de Morte e Vida Severina, do poeta pernambucano João Cabral de Melo Neto, até então inédita nos palcos. O NTEP destacou-se no festival, ao ganhar o prêmio de melhor peça teatral, região Norte, além de melhor ator, dado a Carlos Miranda, que interpretou Severino. No ano seguinte, 1959, no II Festival, realizado na cidade de Santos, o grupo paraense apresentou a peça Édipo Rei, de Sófocles, e novamente se destacou, com a interpretação do ator Carlos Miranda, no papel de Édipo, ganhando prêmio de melhor ator; e Maria Sylvia Nunes, como melhor direção, premiação que deu a ela uma viagem de estudos na Europa.
O grupo participou de mais dois festivais, em 1960, em Brasília, com Pic-nic no Front, de Fernando Arrabal; e em 1962, em Porto Alegre, com Biederman e os Incendiários, de Max Frish. Nesse mesmo ano, o grupo encerrou-se as suas atividades, e alguns de seus membros participaram da instalação do Serviço de Teatro da Universidade do Pará.
Além desses movimentos promovidos pelos grupos expostos acima, havia, em Belém, outras companhias teatrais, como os fundados por Claudio Barradas, além do circuito do teatro popular, que, segundo Vicente Salles (1994), organiza-se de acordo com o calendário cristão: as Pastorinhas, no Natal; Paixão de Cristo, na Quaresma; Cordões de Pássaros e bichos, na quadra junina; teatro nazareno, nas festividades do Círio de Nazaré. Entre os artistas da cidade, alimentava-se o antigo anseio pela criação de uma escola de arte dramática em Belém. E, assim, um grupo de pessoas, composto por alguns líderes do movimento teatral, reuniram-se com o reitor da universidade, José da Silveira Neto, e articularam a criação desse espaço de formação cênica.
Dessa maneira, em 06 de maio de 1962, instalou-se o STUP – Serviço de Teatro da Universidade do Pará – com o curso de Iniciação Teatral, embrião do curso de Formação de Ator, em caráter experimental. Com isso, Belém ganhou um espaço de formação que perdura até hoje com duas licenciaturas, uma em Dança, constituída em 2008, e outra em Teatro, formada em 2009; além do curso técnico em Ator, em Dança, em Cenografia, e em Figurino. Na sua fundação, o STUP ficou sob a coordenação do professor Benedito Nunes, que já era professor da UFPA.
No primeiro relatório feito, em 1964, sobre os dois primeiros anos das atividades do STUP, observa-se a seguinte estrutura: Benedito Nunes, Coordenador; Maria Sylvia Nunes, Diretora dos Cursos; Rafael Vieira da Costa, Secretário; Antonio Fernando Penna, Assistente de Direção; Luís Otávio Barata, Escriturário; Luís Martins de Aragão, Escriturário; Ubiratan Campos, contínuo; Odilon Brito, contínuo. Além disso, mantinham o Centro de Estudos Cinematográficos e a Escola de Teatro com o curso de Formação de Ator. No aspecto curricular, o curso de Formação de Ator tinha as disciplinas: dicção, expressão corporal, estética, interpretação, psicologia, teoria e história do teatro 1ª e 2ª séries. Tinha no corpo docente Amir Haddad, na interpretação; Benedito Nunes, psicologia e estética; Carlos Moura, dicção; Francisco Paulo Mendes, história e teoria do teatro; e Yolanda Amadei, na expressão corporal. Durante os três primeiros anos de atuação, a instituição apresentou os seguintes trabalhos: em 1962, O Inglês Maquinista – Martins Pena; O Delator – Bertold Brecht; O Velho da Horta – Gil Vicente; Caminho Real – Anton Tchekhov. Em 1963, O Diletante – Martins Pena; Os Fuzis da Srª Carrar – Bertold Brecht; O Auto da Barca do Inferno – Gil Vicente. E em 1964, Cenas de Shakespeare: Otelo, Hamlet, A Megera Domada, Sonho de uma Noite de Verão, Ricardo III, Macbeth, O Mercador de Veneza e A Tempestade; O Sonho Americano – Edward Albee; Leonor de Mendonça – Gonçalves Dias; Quebranto – Coelho Neto; Stabat Mater – Pergolesi; A História do Zoológico – Edward Albee.
A Escola de Teatro e Dança da UFPA vem, desde a sua fundação, desenvolvendo um papel importante na formação de artistas para a cidade de Belém, além de propiciar à sociedade o contato com muitas obras do cânone literário, além de resultados de novas experimentações. Os trabalhos são inúmeros, porque em seu currículo a ETDUFPA tem como prática, ao final de cada ano letivo, realizar espetáculos de teatro e dança, como uma forma de aplicar os ensinamentos adquiridos ao longo dos cursos. Muitos trabalhos foram montados, como afirma Cláudio Barradas, em entrevista dada a mim, em 2008: “Com a Escola de Teatro [fiz] “Vereda da Salvação”, de Jorge Andrade; “Nossa cidade”, de Thortou Wilder; “O Papagaio”, de Benedicto Monteiro/ Cláudio Barradas; “Ilha da Ira”, de João de Jesus Paes Loureiro; “Cobra Norato”, de Raul Bopp; “O café”, de Mário de Andrade; “As Troianas”, Eurípedes/ Sartre; “Coronel de Macambira”, de Joaquim Cardoso; “Incelença”, de Luis Marinho; “O Urso”, “O Jubileu” e “Pedido de Casamento”, de Anton Tchecov; “O Desejado”, de Francisco Pereira da Silva”.
O ensino da Escola de Teatro, inicialmente, pautou-se em oferecer uma formação que levou em consideração a tradição teatral no ocidente, além de estabelecer conexões com novas teorias e textos, divididos entre os estudos tradicionais e modernos, percebidos tanto na grade curricular do curso, quanto nas montagens de seus espetáculos.
Dessa maneira, é possível perceber a importância da fundação da Escola de Teatro e Dança da Universidade Federa do Pará, para as transformações das artes cênicas, em Belém, no século XX. E nesse ponto, a instituição teve um importante papel, pois, contribui, ao longo dos seus 52 anos, na formação de artistas e cidadãos na cidade.
Além dos diversos trabalhos que a instituição proporciona todos os anos, destaca-se um interessante movimento, a formação de vários grupos de teatro, que normalmente se estabelecem após o término do curso técnico. Destacam-se alguns deles: Cena Aberta do Pará, Grupo Experiência, Companhia Madalenas, entre tantos outros que compõem a história contemporânea das artes teatrais na cidade de Belém do Pará.
Observa-se, portanto, que a preocupação com a qualidade artística, o apuramento estético, e a construção de um espaço de formação e fomentação teatral foram os motivos que levaram professores e artistas a lutar e dar continuidade a esse projeto, desejado desde a década de 1940. Na cena atual, há diversos pontos para o debate, como a produção, a criação e a manutenção de espaços para as artes cênicas, no estado, mas deixaremos para um próximo momento tais aspectos. Agora, objetivou-se relatar como a Escola de Teatro e Dança da UFPA foi criada, e como seu deu suas primeiras atividades. Pôde-se, assim, perceber que a sua constituição foi mais um momento de transformações pelas quais as artes cênicas passaram, no Pará, na segunda metade do século XX.



[1] Professor da UEPA, e desenvolve pesquisas com enfoque na literatura e no teatro da região amazônica. É doutorando em História, no Programa de História Social da Amazônia, e pesquisa as produções teatrais no Pará entre 1941 a 1990. No início de 2014, publicou o livro Memórias cênicas: poéticas teatrais na cidade de Belém (1957-1990), prêmio IAP de Artes Literárias de 2012, na categoria Memorialística.

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